quinta-feira, 29 de setembro de 2011

Em busca de viabilidade, grupo adota conselheiros de prestígio

DE SÃO PAULO

"Artista não tem visão empresarial", afirma a atriz Bete Coelho.
"Lugar de artista é no palco, e não na sala de espera das grandes empresas, mendigando patrocínio", acredita Maurício Magalhães, presidente da agência de comunicação Tudo.
Não é novidade a luta travada pela maior parte da classe teatral do país para viabilizar seus próprios projetos.
Foi em busca de alternativas a essa realidade que Bete Coelho e Ricardo Bittencourt, fundadores da companhia BR 116, criaram um novo modelo de grupo.
No coletivo, são acompanhados por Magalhães, pela advogada especializada em leis de incentivo cultural Cris Olivieri, e profissionais de diversas áreas de atuação.
Seguindo os princípios do voluntariado, o coletivo se ampara em conselheiros não remunerados, dispostos a disponibilizar tempo, conhecimento, prestígio e contatos com o objetivo de tornar a BR 116, fundada em 2010, uma companhia sustentável. Fazem parte do conselho da BR 116 o diretor regional do Sesc, Danilo Santos de Miranda, o ex-jogador de futebol Raí e a atriz Regina Braga, entre outras pessoas.
"Vou ajudar com contatos e com um olhar de fora. Minha contrapartida será aprender sobre arte", explica Raí.
Segundo Miranda, "a ideia de um grupo gerido profissionalmente e que não se deixa contaminar pelo capitalismo é novidade na área teatral"
Para ele, o renascimento da BR 116 sob o conceito de voluntariado cultural pode marcar "o início de um novo caminho para o teatro".
Já para Bete Coelho, é o primeiro passo para que o teatro possa "erguer-se como indústria, como já aconteceu com a música, o cinema, a literatura e a arte contemporânea". (GM)

quarta-feira, 28 de setembro de 2011


SABATINA FOLHA UOL JEFF KOONS
Minha arte deve melhorar a vida dos espectadores


ARTISTA AMERICANO, NO BRASIL PARA MOSTRA COMEMORATIVA DOS 60 ANOS DA BIENAL DE SÃO PAULO, AFIRMA QUE ARTE "É ALGO TERAPÊUTICO E É AUTOAJUDA" E NEGA QUE SEJA IRÔNICO

ROBERTO KAZ
SILAS MARTÍ
DE SÃO PAULO

O artista americano Jeff Koons, 56, entrou e saiu do palco do Auditório Ibirapuera, em São Paulo, aplaudido como ídolo de rock. Seu discurso, no entanto, lembrou o de um pastor evangélico ou, ainda na seara cultural, o de um escritor de livros de autoajuda.
Autor de "Balloon Flower (Magenta)", escultura vendida há três anos, em Londres, por US$ 26 milhões (R$ 48 milhões), Koons disse, repetidas vezes, que o objetivo de sua arte é "melhorar a vida de seus espectadores".
Portou-se como metralhadora de clichês, dizendo que "o artista tem de confiar em si mesmo, seguir seus interesses e, automaticamente, estará tudo a seu favor" ou que "em arte, aceitando sua própria história, é possível chegar a um ponto de transcendência".
Autor de obras supostamente críticas ao mercado, Koons afirmou não se interessar em "ser um artista irônico, mas em ajudar a comunidade".
Questionado sobre como uma peça vendida a milhões de dólares ajuda o próximo, mudou de assunto, como faria repetidas vezes em seguida.
Koons está no Brasil como convidado da exposição "Em Nome dos Artistas", que celebra os 60 anos da Bienal de São Paulo, com obras do museu Astrup Fearnley, de Oslo.
Antes da abertura da mostra para convidados, ele participou de sabatina Folha UOL no Auditório Ibirapuera.
O evento, que contou com a presença de cerca de 700 pessoas, foi mediado por Fernanda Mena, editora da Ilustrada, e contou com a participação de Fabio Cypriano, crítico da Folha, do jornalista Daniel Benevides, do UOL, e da crítica e curadora Lisette Lagnado, que realizou a 27ª Bienal de São Paulo, em 2006.
Ao final, Koons deixou no ar uma dúvida: seu discurso seria realmente ingênuo e simplista ou seria ele dono de um profundo cinismo, capaz de iludir, por mais de uma hora e meia, a plateia que lotou o auditório?
Leia, abaixo, os principais trechos do encontro:

IRONIA
A palavra ironia significa muitas coisas para pessoas diferentes. Não penso em ironia dessa forma [em que algo é dito sem corresponder ao que se quer dizer].
Para mim, ironia é olhar para as coisas de outro ponto de vista, mas não acho que ironia tenha que ter uma conotação negativa.
Não sou um artista irônico. Há ironia em meu trabalho porque há muitos pontos no meu trabalho, mas não essa questão negativa, cinismo ou outras camadas negativas. Talvez essa seja uma qualidade.
Se você acha que meu trabalho é simples, o que é melhor filosoficamente? Achar algo simples ou negativo?
Estou ajudando minha comunidade fazendo trabalhos objetivos.

AUTOAJUDA
Arte é, sim, algo terapêutico e é autoajuda.
Todo momento na vida de alguém é autoajuda. Não sei quando isso acaba ou se deve acabar, mas acredito que sim. Arte é terapêutica. É educativa, põe as pessoas em contato com coisas que não veriam, mas, se é terapia, não posso afirmar. Creio que artistas estão sempre buscando maior intensidade, maior sentimento.

AUTORIA
Esse tipo de tensão [entre arte feita pelo artista e aquilo que ele delega a seus assistentes] é algo em que penso todos os dias.
Mas existe um real sentido de beleza em estar fisicamente envolvido em algo. Você pode fazer gestos na vida sem fisicamente fazê-los. Pode ser um gesto intelectual ou algo grandioso o suficiente que pode até levar à transcendência.
Matisse fez coisas incríveis só recortando e colando. Há formas de não depender do corpo, como Duchamp fazia com os "ready-mades".
Eu emprego cerca de 200 pessoas, mas é como mandar num dedo.
Todos os assistentes estão tentando atingir essa meta estabelecida por mim, essa visão que eu mostrei qual era.
Uma vez que você tem a visão, pode chegar a qualquer lugar. Tenho a visão do que quero fazer e desenvolvo sistemas precisos para mostrar como isso deve ser executado para ficar exatamente como eu quero.
A última vez que pus a mão num quadro meu faz uma década. Seria como Deus, o chefe de operações de uma grande empresa, ser o responsável que está olhando para tudo, para ter certeza de que as árvores não percam as folhas, alguém que precisa se reportar aos acionistas.

COPYRIGHT
Em tudo que fiz, sempre pedi permissão [para se apropriar de imagens]. Sempre que achei que tivesse que pedir permissão, eu pedia.
O único motivo pelo qual eu me preocupei com [os aparadores de livros em formato de] "Balloon Dog" é que eles estavam sendo vendidos em lojas de museus, e as pessoas pensavam que eram meus.
Havia cachorrinhos vendidos na internet e vendiam como se fossem meus, mas eu nunca fiz edições dessa forma. Eu acredito que a lei de copyright é importante como forma de manter um diálogo e acredito que as pessoas devem brigar por direitos quando acharem necessário. Não é tudo preto e branco.

PORNOGRAFIA
Eu amo a arte de Manet, Boucher, Fragonard, a Vênus de Willendorf, poesia, sensualidade. Eu aproveito a vida, gosto da ideia de procriação, então acho que arte é um veículo que nos ajuda a comunicar nossos potenciais e como podemos viver uma vida a mais vasta possível.
Muitas coisas nos excitam, como andar de montanha-russa. Mas ter interesse em atos de procriação ou interesse no corpo não é necessariamente pornografia.
A arte lida com experiências estimulantes, em que certas reações químicas acontecem.
Nossos corpos respondem à excitação, ao perigo.
As pessoas não tinham um problema com a beleza do corpo humano, isso não quer dizer que temos sempre de pintar folhas de figueira e panos para aceitar nossos corpos. ["Made in Heaven", série em que aparece com Cicciolina, sua ex-mulher, em posições eróticas] É uma série que fala da beleza do corpo em seu sentido mais clássico.

terça-feira, 27 de setembro de 2011

Estrelas globais das artes, Damien Hirst, Jeff Koons, Cindy Sherman e Matthew Barney estão em mostra comemorativa do aniversário da Bienal de SP

OS NETOS DE ANDY WARHOL

Estrelas globais das artes, Damien Hirst, Jeff Koons, Cindy Sherman e Matthew Barney estão em mostra comemorativa do aniversário da Bienal de SP

Eduardo Knapp/Folhapress
"Mother and Child Divided", obra de Damien Hirst, na mostra comemorativa

SILAS MARTÍ
DE SÃO PAULO

ma vaca e um bezerro cortados ao meio flutuam em um tanque cheio de formol.
Esse espetáculo de atração e repulsa ocupa um espaço central do pavilhão da Bienal de São Paulo, no Ibirapuera.
O britânico Damien Hirst é o artista por trás dessa natureza-morta literal.
Seus excessos visuais pautaram a geração de norte-americanos "blockbuster" escalados para a exposição "Em Nome dos Artistas", que celebra 60 anos da Bienal paulista -espécie de aquecimento para a sua 30ª edição, que ocorre apenas em 2012.
Nas últimas décadas, a produção de nomes como Jeff Koons, Richard Prince, Cindy Sherman e Matthew Barney deixou para trás a noção clássica de artistas plásticos em seus ateliês espartanos.
Eles se tornaram celebridades, esticando aqueles 15 minutos de fama tão propagados por Andy Warhol.
O flerte com a indústria do entretenimento se tornou, em certos casos, matrimônio: Koons foi casado com a ex-atriz pornô italiana Cicciolina e Barney divide a vida com a cantora islandesa Björk.
Suas contas bancárias também são dignas de estrelas. Em pleno cataclismo financeiro global de 2008, Hirst vendeu R$ 500 milhões em obras num leilão-espetáculo em Londres, um dos epicentros da crise do crédito.
No mesmo ano, uma escultura de Koons foi arrematada por R$ 48 milhões e Sherman bateu recorde com uma foto vendida por R$ 7 milhões.
"É verdade que esses artistas têm enorme visibilidade", diz Gunnar Kvaran, curador do museu norueguês Astrup Fearnley, que emprestou as obras da exposição. "Eles são como os netos de Warhol que entraram no 'star system'."
Na mostra é possível entender como isso aconteceu.
Numa pintura, Koons faz sexo oral com Cicciolina, Sherman se autorretrata como a Virgem lactante e Prince reinventa o cáuboi dos comerciais de Marlboro.
Todos se apropriam de fragmentos da cultura visual, pop e erudita, para articular imagens tão sedutoras e excêntricas como suas próprias personalidades.

EMERGENTES
Menos vistosos, também estão na mostra artistas consagrados que trilharam caminhos estéticos mais sutis.
Felix Gonzalez-Torres, cubano radicado nos Estados Unidos, explora questões autobiográficas em instalações que dialogam com o minimalismo, como um grande tapete feito de doces embrulhados em celofane azul.
Questões arquitetônicas e espaços ermos e vazios estão num vídeo de Doug Aitken, artista que já projetou uma série de curtas na fachada do MoMA, em Nova York.
Shirin Neshat, iraniana radicada em Manhattan, também cria videoinstalações mais sóbrias, em que discute a condição feminina no Irã e inventa fantasias utópicas para sublinhar as contradições do mundo muçulmano.
Na ala mais jovem e não menos controversa da América, artistas como Nate Lowman, Paul Chan, Frank Benson, Dan Colen e Terence Koh, chinês radicado em Nova York, reinventam noções de escultura e videoarte em obras críticas à hegemonia norte-americana no planeta e ao consumismo do país.
Entre os mais polêmicos, Koh, famoso por ser amigo da estrela pop Lady Gaga, já vendeu até seus próprios excrementos folhados a ouro e não se acanha em usar esperma e outras secreções como material de suas composições.
Na mostra comemorativa, ele exibe duas esculturas cobertas em ouro e purpurina, construídas com abelhas e a cabeça de um babuíno.